quinta-feira, janeiro 20, 2011
A Nova Marginália
Hoje começo a publicar uma sequência de textos e poemas de autores envolvidos na mobilização Verão Revolução 2011, neste post com um conto sem título de Gui Nascimento (@twittandosuamae), publicado no zine Nothing Gold Can Stay, lançado no último sábado, 15/01. Curti bastante, espero que gostem também.
Até logo.
Na LUTA!
Adriano Pacianotto
(conto se título) - por Gui Nascimento
Por que a vida parece menos pesada quando descrita desse modo? Eu, sentado na cadeira; ele, por trás da mesa, com uma uma pilha de formulários em branco e um carimbo: Qual é o problema? Comecei com o da coluna... tão torta quanto a do Forrest Gump. É claro que eu não chegaria a ponto de ter que usar aquela engenhoca nas pernas para poder corrigir minha postura. Que postura? Nem física nem engajada. "O que você faz?". Foi nesse ponto que eu comecei, não foi? Trabalho em um escritório, nada demais, sabe Doutor. Pagam bem, dá pra tomar café o dia inteiro e ficar na Internet. Coisas desse tipo. Se eu ainda estudo? Não. Já estou com vinte anos, terminei o ensino médio. É, eu sei, pareço ter uns dezessete. Sempre pedem a minha identidade quanto eu vou à boate. Deve ser por causa do meu físico meio franzino. Ah, sim, com relação aos estudos, eu penso em continuar o ano que vem, mas estou em dúvida entre jornalismo e letras. Pousei o livro do Kafka na ponta da mesa. Eu tinha levado pra ficar lendo na sala de espera. Não aguentava ver telejornal com aquela TV lá no alto, presa num suporte na sala de espera. Também não suportava as crianças chorando desesperadas temendo as agulhas escondidas naquele mundo de corredores e portas com cheiro de álcool e desinfetante. Cheiro típico de hospital. Os velhos também me deprimiam. Não. Não vou chegar a esse ponto. Antes dos quarenta eu tô puxando o gatilho. Quarenta ainda é cedo, dizia Pedro. Com certeza, meu bem, mas não é todo mundo que chega aos quarenta e dois com corpinho de vinte, como você chegou, respondi na ocasião. O Doutor Valdemar diria a mesma coisa, mas aquilo não faria parte das minhas respostas. Aquilo estava num plano confessional mais profundo e desesperado. Talvez bêbado eu pudesse chegar a tal ponto. O lance com o Doutor Valdemar era o de pura atuação. Além da minha coluna torta todo o resto deveria ser belo e simples como nunca foi realmente. Ali, naquela salinha branca que mais lembrava uma cela de prisão de primeiro mundo, eu preferia não me lembrar dos contos e romances largados pela metade, salvos em meu computador há meses atrás. Ou o violão Eagle Folk, guardado dentro da capa há duas semanas, quando eu havia tentado compor uma música nova e terminei entrando em desespero estourando três cordas aflitivamente. Nada daquilo deveria ser relatado. Ele comentou algo sobre a crise, e eu argumentei algo sem importância. Pediu que eu ficasse de pé e tirasse a camisa. Ele tateou e não disse nada, como é costume de todo o clínico geral, não se envolver, apenas encaminhar. Peguei os formulários, o Kafka e me despedi educadamente. Acho que ouvi um "boa sorte", mas foi impressão minha.
1 comentários:
Valeu, man! Que bom que vc curtiu, tmbém curto muito o teu blog, e estou seguindo.
A nova marginália, hahahah.
Abrz.
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