Alvaro Alves de Faria
Caio dentro do poema
como um pássaro ou um raio,
e faço progredir a espiral do ritmo,
e o poema cresce como uma flor noturna,
expectativa e instante,
imagem e dúvida.
Falo dentro de mim mesmo,
como um rádio,
um bonzo suicida
levantando a palavra do fundo?
Circunscrevo a sensação de estar
partindo dentro do verso
em sua raiz original?
Ou lanço a cinta pelo espaço amarelado,
dentro de um avião de dor
doendo profundamente,
na procura do terrível,
o parto agitado
e grávida placenta
em sangue caindo?
Libertarei o poema
e na cara porei o visto
ou o visgo e o amálgama
de tempo e arma?
No que procura nascer,
antes de amanhã,
ainda amanhã,
o espanto do poema ameaçado,
o círculo oprimido
a emoção e o salto.
Compreendo que a perspectiva
é um pulo para fora,
e de fora, a perspectiva
poderá ser um pulo para dentro.
Exijo uma solução,
soluçando um soluço mudo,
ou mudo soluçando a solução?
E a poesia:
passará do sangue e suor,
gerando o poema que demora,
como impulso brusco,
atenuante delírio
como um soco?
Equivale dizer: a palavra é o eixo,
raiz do sangue,
baque de queda surda,
canivete lapidando as farpas,
abrindo o embrião da arte
ao que vale,
como vale a vida e a poesia ainda vale,
o corte, o senso, o amor,
a idéia, o golpe e o desfecho
da poesia nascendo
como um filho que vem da própria carne,
e sai, e transpira
e evolui e se atira
como um ferro.
Alvaro Alves de Faria - do livro "4 Cantos de Pavor e Alguns Poemas Desesperados" (1973)
www.alvaroalvesdefaria.com/#/contato/4524521074
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